Saúde mental no trabalho

Saúde mental no trabalho: qual a responsabilidade da empresa?

Depressão. Ansiedade. Síndrome de Burnout. Esses distúrbios e transtornos emocionais fazem parte da realidade de cada vez mais brasileiros.

Cresce, também, o número de trabalhadores que desenvolvem doenças de saúde mental por causa de estressores relacionados ao trabalho.

Por isso, a saúde mental no trabalho é um dos principais temas abordados pela Campanha Setembro Amarelo, mês destinado à prevenção e conscientização sobre o suicídio. Afinal, a saúde mental e a boa qualidade de vida andam lado a lado.

Uma pesquisa recente, realizada pela B2P, um serviço de consultoria especializado, aponta que os transtornos mentais são a segunda principal causa de afastamento do trabalho no Brasil em 2021. E, dos casos analisados pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mais de 23% foram motivados pelo próprio trabalho.

Os problemas de saúde mental no trabalho são menores apenas que os do sistema osteomuscular, que representam a principal causa de afastamento do trabalho atualmente.

Portanto, tanto para empregadores quanto para trabalhadores, é imprescindível falar sobre isso.

E há diversas questões importantes aqui, desde os direitos do trabalhador até as obrigações da empresa quanto à saúde mental no trabalho. É o que veremos nos tópicos a seguir.

Saúde mental no trabalho: os direitos do trabalhador

A garantia à saúde é um direito humano básico, assegurado pela Constituição Federal de 1988. Portanto, a saúde mental no trabalho também  é um direito fundamental.

Porém, embora a garantia de um ambiente de trabalho saudável seja responsabilidade do empregador, o Direito do Trabalho conta com um crescimento de demandas dessa natureza que ainda não estão tipificadas nas normas de Medicina e Segurança no Trabalho, previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e nas normas regulamentadoras (NRs), criadas com a lei nº 6.514 de 22 de dezembro de 1977, para fazer cumprir o disposto na CLT.

As normas de Medicina e Segurança no Trabalho, por exemplo, asseguram ao trabalhador:

  • Direito a um ambiente de trabalho seguro;
  • Direito à saúde ocupacional, com o acompanhamento médico periódico no trabalho;
  • Afastamento remunerado do trabalho (licença médica) de até 15 dias;
  • Auxílio doenças do INSS para afastamentos por período mais longos;
  • Estabilidade empregatícia de 12 meses após término do tratamento;
  • Direito à aposentadoria por invalidez caso não se recupere.

Embora haja algumas propostas na Câmara dos Deputados que preveem a edição de norma regulamentadora (NR) com medidas de prevenção e gestão de riscos no ambiente de trabalho que podem afetar a saúde mental dos trabalhadores, ainda não existe regulação específica sobre o assunto.

A falta de normatização para situações que fogem dos perigos físicos dificulta o trabalho de fiscalização, agravando ainda mais o problema.

Acontece que o excesso de trabalho, o desvio e o acúmulo de função, a gestão por estresse e as longas cargas horárias são fatores de risco em comum para os principais transtornos mentais.

E doenças mentais desenvolvidas ou agravadas no ambiente de trabalho também caracterizam doenças ocupacionais. Portanto, devem ser compreendidas e tratadas com seriedade pela empresa.

Então, afinal, quais os direitos do trabalhador acometido por algum transtorno ou doença mental?

O empregado que sofre de alguma doença mental que o impossibilite de continuar trabalhando deverá ser afastado do trabalho.

  • Nos primeiros 15 dias, ele continua recebendo o salário normalmente e, caso a necessidade de afastamento se prolongue, a partir do 16º dia o salário será substituído pelo recebimento de auxílio-doença pago pelo INSS. Para isso, porém, é preciso laudo do médico do INSS atestando a necessidade do afastamento.

Se a doença mental que gerou o afastamento do funcionário tiver sido causada ou ainda agravada em razão do trabalho, ela é equiparada a acidente laboral. Se este for o caso:

  • A partir do 16º dia de afastamento, o trabalhador receberá auxílio-doença acidentário. Como consequência, diferentemente do afastamento não vinculado ao acidente do trabalho, ao retornar ao serviço, o empregado terá estabilidade no emprego pelo período de um ano.

Por fim, a doença mental jamais poderá ser motivo para a demissão do empregado. Tal conduta seria discriminatória e, além da indenização, dá direito à reintegração ao empregado.

Condições de trabalho que podem provocar transtornos e doenças mentais

Como um indivíduo passa a maior parte do dia exercendo sua atividade profissional, é inegável a influência o trabalho não apenas na saúde física, como também na mental.

O colaborador não deve ser visto apenas como mera engrenagem do processo produtivo. Uma relação ruim com o ambiente de trabalho pode desencadear um sentimento de angústia e ansiedade no dia a dia desse indivíduo, e, consequentemente, sérios problemas de saúde mental.

Várias condições de trabalho podem conduzir a riscos psicossociais, tais como:

  • Cargas de trabalho excessivas;
  • Cobrança de metas abusivas;
  • Exigências contraditórias e falta de clareza na definição das funções;
  • Falta de participação na tomada de decisões que afetam o trabalhador e falta de controle sobre a forma como executa o trabalho;
  • Eventos traumáticos;
  • Perseguição ou isolamento do trabalhador;
  • Má gestão de mudanças organizacionais, insegurança laboral;
  • Comunicação ineficaz, falta de apoio da parte de chefias e colegas;
  • Assédio psicológico ou sexual e violência de terceiros.

Saúde mental no trabalho: as obrigações do empregador

A principal obrigação do empregador é prevenir e minimizar quaisquer riscos e danos à saúde do trabalhador no exercício da função. Portanto, ter um programa de saúde ocupacional em conformidade com as NRs do Ministério do Trabalho, além de obrigatório, é fundamental.

Esse é a primeira e principal obrigação do trabalhador com relação a saúde mental no trabalho, mas há outras que incluem:

  • Prevenir a fadiga e evitar jornadas de trabalho exaustivas, respeitando o que dispõe a CLT sobre horários de trabalho e horas extras;
  • Proporcionar intervalo para descanso/almoço e férias;
  • Acompanhar colaboradores com sintomas de transtorno mentais através do programa de saúde ocupacional da empresa;
  • Encaminhar o trabalhador que precise de auxílio especializado para o tratamento médico-psiquiátrico e acompanhamento psicológico;
  • Afastar o colaborador com problemas de saúde mental através do INSS, se necessário for.

Em outras palavras, a empresa deve atuar com consciência e tratar a saúde mental no trabalho de maneira séria e assertiva.

Como evitar problemas de saúde mental no trabalho na sua empresa?

Para evitar problemas legais com ações trabalhistas, é preciso conscientizar-se e aprender a lidar com a saúde mental no ambiente organizacional. Portanto, além de entender bem o problema e suas consequências, gestores e líderes de equipe devem, em primeiro lugar, proporcionar um ambiente de trabalho saudável.

Para isso, é fundamental investir em medidas que proporcionam um bom clima organizacional, incluindo:

  • Reconhecer e valorizar o colaborador e suas contribuições para a empresa;
  • Investir em treinamento e capacitação para a equipe;
  • Estimular a prática de atividade físicas e hobbys;
  • Promover a manutenção de boas práticas de relacionamento interpessoal;
  • Realizar palestras e eventos informativos sobre saúde mental no trabalho.

Tudo isso implica em investir em uma gestão que reconhece a importância de seus recursos humanos e respeita o colaborador. Ou seja, uma gestão que busca resultados e desempenho através da valorização e do cuidado com a sua equipe de trabalho.

E como lidar com os casos já diagnosticados?

O mais importante é reconhecer que o colaborador precisa de ajuda e levar o problema de saúde mental no trabalho a sério. Portanto, o empregador deve tratar o trabalhador de forma humanizada e dar a ele todo apoio necessário segundo determina as leis trabalhistas.

Então, sempre que um caso de problema de saúde mental no trabalho for diagnosticado na sua empresa, encaminhe o colaborador para o tratamento adequado. Para isso, você pode contar com o médico do programa de saúde ocupacional.

O trabalhador pode precisar de licença médica por alguns dias, porém entenda que pode ser necessário afastar o funcionário pelo INSS por tempo indeterminado.

E a empresa não pode demiti-lo durante esse período, e nem depois que ele retornar, pelo prazo de 12 meses, como já mencionado.

Conheça as principais doenças mentais que podem gerar indenizações trabalhistas

Há diversos transtornos e doenças mentais que podem ser conectados ao ambiente profissional.

Confira, a seguir, alguns dos principais problemas de saúde mental relacionados ao trabalho.

Síndrome de Burnout

A Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Total Esgotamento Físico e Mental, é um transtorno emocional cuja principal causa é o excesso de trabalho. Suas principais características são:

  • Exaustão extrema;
  • Estresse;
  • Esgotamento físico.

É um problema de ocorrência comum para profissionais que atuam sobre pressão constante, como policiais, médicos, professores e jornalistas. Mas, pode acontecer com qualquer trabalhador cobrado em excesso e que precisa cumprir metas de trabalho além das suas capacidades.

Depressão

A depressão no ambiente de trabalho é outro transtorno mental comum e se caracteriza principalmente por:

  • Cansaço excessivo;
  • Irritabilidade constante;
  • Baixa motivação e pouca autoestima;
  • Problemas de sono;
  • Perda de apetite e baixa libido;
  • Dificuldades de atenção e memória;
  • Agressividade, raiva, crises de choro, problemas de humor;
  • Problemas de relacionamento interpessoal.

O trabalhador com depressão costuma ter uma rápida e repentina queda na produtividade.

A Síndrome do Pânico

A Síndrome do Pânico é uma forma de transtorno de ansiedade aguda, que se caracteriza principalmente pela ocorrência de crises profundas e repentinas de medo aterrorizante, sem motivo aparente.

Durante a crise, também pode ocorrer sudorese excessiva, taquicardia, palpitações, náuseas, falta de ar, calafrios, ondas de calor, tonturas, desmaios, tremores e agitação extrema.

Entre as causas principais estão o excesso de trabalho, cobranças irreais, situações de assédio e clima organizacional ruim.

Transtorno de Ansiedade

O Transtorno de Ansiedade tem como principal característica o medo e a preocupação excessiva com o futuro e até mesmo com situação cotidianas.

As principais causas desse transtorno no trabalho incluem a falta de reconhecimento profissional, comunicação agressiva, metas e cobranças irreais e a sobrecarga de tarefas.

Alcoolismo

O alcoolismo nem sempre se desenvolve no ambiente laboral, pois suas causas são várias, desde problemas familiares até questões psicológicas. Contudo, quando o problema surge no trabalho, a principal causa costuma ser o estresse.

Porém, independente do motivo, ele impacta diretamente na produtividade e na segurança do trabalho.

É importante saber que o colaborador com problemas de alcoolismo também não pode ser demitido pela empresa por justa causa, pois assim determina o Tribunal Superior do Trabalho – TST.

Portanto, o trabalhador com problema de alcoolismo deve ser acolhido pela empresa, afastado do trabalho e encaminhado para tratamento médico.

Conclusão

Infelizmente, os transtornos mentais ainda não são levados a sério como deveriam, tanto pela população em geral quando pelas empresas. Isso acontece porque um problema de saúde mental não é visível, nem pode ser comprovado por exame de imagem, como uma doença física ou acidente de trabalho.

Porém, quando a perícia médica comprova que o problema de saúde mental de um funcionário se desenvolveu ou foi agravado  pelo ambiente de trabalho, ele adquire o mesmo status de um acidente ou doença ocasional.

Dessa forma, o Setembro Amarelo acende um alerta importante para as empresas, que devem proporcionar uma ambiente sadio e seguro a seus colaboradores em todos os seus aspectos, de maneira holística.

Prevenir o desenvolvimento ou agravamento de transtornos mentais relacionados ao trabalho é desafio a ser enfrentado nas novas formas de organização do trabalho não apenas para garantir o direito dos trabalhadores à saúde, mas também como forma de diminuir os custos do trabalho e da Previdência Social, pois, no final das contas, trata-se de questão de ordem pública e de relevante interesse social.

Ou seja, é preciso entender, prevenir e promover a saúde mental no trabalho. Pois, dessa forma, todos ganham. O trabalhador ganha em qualidade de vida e a empresa ganha em maior produtividade.

Você pode saber mais sobre a iniciativa no site oficial da campanha, basta clicar aqui: Setembro Amarelo.

 

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Se ainda tiver dúvidas sobre o assunto ou se decidir ir atrás de seus direitos, entre em contato conosco, que a equipe da Tavares Vasconcellos Advocacia terá o maior prazer em te ajudar.

 

JOÃO PAULO TAVARES é advogado, sócio titular de TAVARES VASCONCELLOS ADVOCACIA e presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB São Caetano do Sul/SP

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